14 de janeiro de 2011

Os espinhos na carne

A capacidade de esforço nem sempre é recompensada pela efectividade de uma recompensa. As respostas dadas a perguntas que fazemos a nós próprios deparam-se, não poucas vezes, com becos em que não existe saída - ou essa mesma saída está dissimulada por detritos e cartazes já gastos de espectáculos que nunca quisemos ver. Desenhamos - ou melhor, EU desenho… já que não sei falar para além de mim - estratégias que julgamos perfeitas, ou no mínimo satisfatórias. Pintamos cores em mapas fotocopiados de livros onde tudo corre sempre bem. Mas as cores são inventadas. As cores são despejadas sem sabermos a sua correcta ordem e quantidade. Um mapa de cores vibrantes tem um brilho que não é igual para todos. Ou tem legendas e escalas em medidas que mais ninguém aprendeu.

Muitas vezes, descobrimos que a nossa escola é apenas partilhada por poucos. E que esses poucos não vivem no mesmo sítio, não falam da mesma forma. A nossa escola está em vias de extinção. Somos poucos - e não somos bons - custa, mas é verdade. Ou sabemos de menos, ou temos de menos, ou queremos de menos. A nossa oratória já está gasta. Já o desconfiava… sei-o agora com toda a certeza. Aqueles que estavam do nosso lado estão cansados. Outros achavam mais fácil. Que bastaria dizer que se quer - ser assim, estar assim… pensar e viver assim. Resta saber de quem é a fraqueza - se nossa, se deles. Da minha parte, admito-a - infelizmente. As forças de inventar e reinventar já foram mais. Mais do que me frustarem os resultados, é o processo que me está a custar muito. O tempo que demora. As horas terem espinhos. E cada passo - cada metro - faz feridas nos pés. E não existem chagas que justifiquem a via sacra. E não pode haver contentamento quando quando nos espetam facas nas costas. Embrulhadas em sorrisos.

Hoje estou assim. Desiludido. Mais do que com o caminho, é com a dureza e por irem escasseando os apoios. Não faltam aqueles que fariam melhor. Assim o afirmam peremptoriamente. Muitos sabem muito - mas conseguem o mesmo pouco que eu… ou ainda menos. Só que eu admito que, por vezes, a via que todos julgam ser a mais fácil é a que me interessa. E aliás, ela não é mais fácil - é (apenas?) a necessária neste preciso momento. Nesta etapa em que me encontro. E "esses" - os de fácil julgamento e gigante presunção - ainda não tiveram de tirar espinhos da carne. Não quiseram risco de fechar os olhos e voar. Apenas falam dele à boca cheia - anuncia a ilusão como se fala do éden. Mas o paraíso deles é apenas teórico. E, precisamente por isso, ainda não perceberam que esse éden não existe. Fora dos livros que carregam para todo o lado. Com a capa virada para fora - para que todos os outros vejam e suspirem de admiração. Eu já não suspiro por irrealidades. Amo e quero - com todo o meu corpo - prazeres reais. Daqueles que não têm invólucros bonitos, mas que alimentam e sabem a vida.

Acima de tudo, já não quero conversa fiada. Quero ir a jogo com quem sabe chorar enquanto luta com todas as forças. Que beija sofregamente - porque não sabe fazê-lo de outra forma. Os outros, quero-os de lado. Deixem-se estar na bancada, enunciando teorias sobre o mundo das utopias. Estou em campo, pronto para a batalha. Os vossos assobios não chegam aqui. Não sou anjo de capela. Nem loiro, nem assexuado - muito menos santo. Tenho o cabelo da cor da noite - olhos verdes como os campos do horizonte - asas vermelhas de sangue e raiva e amor e ilusão e necessidades e energia. Estou aqui. Onde tudo se decide. E não estou pronto para desistir.

R.

1 comentário:

Palavras sem Direção disse...

É... como dizia o Mario Quintana: "em que mundo estou que não me reconheço?" - adorei o texto!