Assim, se eu fosse...
hora do dia - à noite (quando nas ruas apenas se ouve o som distante de um carro e latido perto de um cão)
astro - lua cheia (quando a noite tenta imitar o dia)
direcção - sempre em frente (em busca de um sonho ainda por sonhar)
móvel - a cortina da janela (que me isola do mundo lá fora quando me quero esconder)
líquido - o sangue que me corre nas veias (e o seu vermelho-vivo que me lembra que também os anjos sangram)
pecado - quero-los a todos (só assim me sinto vivo)
pedra - o seixo da praia perdida entre as falésias
árvore - aquela que cresce em frente à minha janela (e que, todos os anos, perde as folhas para a seguir as ganhar - querem maior milagre da natureza?)
fruta - a banana (que demora menos a descascar)
flor - orquídea (que, como dizia Al Berto, imita a vida, porque se reproduz com dificuldade)
clima - o pino do outono ou da primavera (é o intermédio... ainda tudo pode acontecer)
instrumento musical - o saxofone (representa a solidão das grandes cidades que nunca dormem)
elemento - sou todos a espaços (agora, sem dúvida ar, porque me sinto despegado de tanta coisa)
cor - o vermelho-vivo do sangue, ou o âmbar dos candeeiros das ruas
animal - o cão solitário, ou o pássaro que todos os dias canta em frente à minha janela
som - o som das cidades à noite (acima de tudo os silêncios)
música - talvez laurie anderson... ou os donna maria
estilo musical - aquele que posso ouvir sem prestar atenção, aquele que me ajuda a libertar as ideias
sentimento - muitas vezes, a solidão de que necessito para ser realmente criativo
livro - sem dúvida o 'Lunário'
comida - um bom sushi vinha a calhar, ou uma comida alentejana (nunca se esquecem as origens)
lugar - uma praia no deserto, ou o bulício duma grande cidade (para mim, barcelona)
gosto - da pele suada do amor, ou de um bom vinho
cheiro - da pele suada do amor (bis), ou de uma flôr que teima em romper
palavra - várias: neste momento, memória e afecto
verbo - querer, olhar, amar, enfim: estar
objecto - uma moleskine que me acompanha para todo o lado
peça de roupa - um fio que não largo há já algum tempo
parte do corpo - os meus olhos verdes
expressão facial - alguns olhares que dizem tudo: acima de tudo os de desejo e afecto
desenho animado - vento nos salgueiros (alguém se lembra?)
um filme - as asas do desjo (wim wenders)
forma - quase sempre, o corpo de uma mulher; ou as milhentas formas de se dizer amo-te ou acabou
número - os longos minutos de insónia
estação - a de combóios: sempre à espera de partir para algum lado
frase - estamos sós com tudo o que amamos (novalis)
Pronto, já está. Quem quiser apanhar este rio de ideias, fique à vontade - eu fico aqui, a pensar no que escrevi. Estranho, como podemos resumir a nossa existência a um punhado de correspondências... ou não.
R.
6 comentários:
perdi o álbum de donna maria antes de o poder degustar...
lembraste-me serões serenos.
és bonito :)
ainda bem que gostaste do meu eu-em-palavras - diz mais que uma imagem/foto.
p.s. realmente, o álbum dos donna maria foi uma feliz descoberta.
solitude! fizeste-me lembrar esta música.
uma palavra que parece repetir-se em ti, mas não uma solidão negra, penso que seja mais uma solidão de paz e silêncio reconfortante. será?
de qualquer forma, gostei, muito diferente das restantes respostas que já li.
pinky: solidão de paz... uhmm, gosto da expressão. acho que define bem a "coisa".
nunca percebi porque foi desvalorizado o poder de uma boa solidão. é como uma conversa esclarecedora, mas connosco próprios.
e é sempre tão difícil (impossível?) encontrarmos alguém que nos perceba totalmente - alguém com quem as palavras não sejam necessárias - apenas um olhar...
é por tudo que a tua ausência cria vazios.
isabella: sim, tenho andado ausente... ausente das grandes insónias passadas em companhia de outras almas errantes... ausente de ideias transformadoras que só a noite apadrinha. tenho andado ausente de mim.
quero reencontrar-me - quem sabe encontrar um porto de abrigo e para lá morar.
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