13 de março de 2007

1ª foto do fogo - a noiva

Despedi-me de ti naquela manhã de inverno. Ou de verão, mas que para mim foi e será sempre de inverno. Vi-te de arma ao ombro, e de boina mal amanhada na cabeça. Vi-te como te vejo agora: sorriso largo, ombros largos. Aqueles ombros para os quais ansiava sempre voltar nos dias de tristeza. E que sonhava apertar nos tempos felizes que passámos. Já passaram quarenta anos e ainda me lembro como se fosse ontem. Sim, porque hoje quero esquecer.

Escolhi o melhor vestido, aquele que apenas usava para domingos de missa. Escolhi sapatos a condizer. E escolhi a melhor cara. A cara que te servia a ti, que te encorajava nessa viagem para lugares distantes. Escolhi essa cara que me fazia sofrer, essa cara que mascarava o grito que me apetecia soltar. Mas não gritei. Até esta hora em que o baú se abre, eu não gritei. Dizer, hoje, «não vás» já não serve de nada. O grito não passa agora de mero sussurro, de mera memória junta a tantas outras que nos ligam um ao outro. O grito que deveria ter soltado naquela altura é agora despropositado, porque tardio

Estava ali, naquele cais de embarque. E tu do outro lado da grade. Eu vestida de cerimónia - vestida de celebração... E tu de farda, de calça vincada e de casaco marcado à cintura. E uma grade a separar-nos - depois um mar imenso entre nós. Que nos separou para sempre.

R.

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