9 de março de 2007

Adornos

- Às vezes, apetece-me usar máscara. Às vezes protegem... porque nem sempre me apetece ser o R. Muitas vezes apenas e só um anjo caído, no meio da multidão.

- Mas assim não te dás a conhecer... Sabes que perdemos oportunidades por não nos mostrar-mos...

- Mas, minha anjinha, sou vezes demais o R. - sou vezes demais as obrigações do R. O anjo caído não tem obrigações, apenas desejos. E, no meio da noite, quando apenas os cães vadios se ouvem na solidão das ruas desertas, enquanto R. dorme, o anjo voa solto - em busca de alguém ke o acompanhe.

- Isso emociona-me muito...

- ...

- ...

- Diz-me anjinha... onde gostarias de estar agora - se pudesses escolher? A mim, apetecia-me viver um mês, dois, três naquelas aldeias perdidas no mapa. Mas não julgues que é aquele "apelo do campo" que quase todos os citadinos aderiram como moda. Falo de querer estar num sítio onde tudo está à distância de dois passos; falo de sentir o cheiro da chuva, de sentir os efeitos da geada.

- Que bonito. Ainda bem que te conheço...de alguma forma.

- Conheces-me - conhecemo-nos - da melhor forma. Pelas emoções, pelas asas; e não pela marca do carro, não pela roupa que assentará bem no teu corpo e mal no meu. Não por termos amigos comuns e partilharmos jantares onde se fala da actualidade e da vida como se de uma novela se tratasse. Nós estamos ligados por penas - e não por mãos.

- ...Emociono-me muito facilmente com as tuas palavras... Serás mesmo assim??

- Se sou assim? Se tiro prazer de olhar o sol a pôr-se na linha do horizonte? Se adoro as luzes dos candeeiros pela noite, e o som dos carros no longínquo? Se é a isso que te referes, sim sou mesmo assim. E tu, como és?

- Quero-me definir e tenho medo de o fazer... Porque conhecer-nos a nós mesmos faz parte de todos os nossos medos. Descobrimos sentimentos, sensações que nos mostram do que realmente somos feitos. Lados lunares aparecem... e é bom(?!) O prazer mistura-se com o medo. Talvez por isso, não me quero descobrir na totalidade...

- Sim, realmente, o que nos dá maior prazer é normalmente também o que nos inspira maiores receios. Não gostamos de arriscar, de nos expôr. A acomodação é bem mais fácil; só que nos deixa um vazio na alma. Contentamos este corpo, esta casca humana; mas ficamos ocos, iguais uns aos outros. Se arriscamos, logo somos criticados - muitas vezes, até por nós próprios.

- Sim é isso mesmo. E eu critico-me tanto...

- Todos nós anjinha o fazemos. Mas, por vezes, explodimos... mandamos para as nuvens tudo o que nos rodeia e recomeçamos ou fugimos. Por isso, se me perguntas, é assim mesmo que sou... o resto, os empregos, os sapatos, as roupas que caem mais ou menos mal, tudo isso são adornos.

R + F

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